terça-feira, 5 de maio de 2015

Em Comida di Buteco e papo de mulher, jiló será sempre jiló

Nada como a boa e velha conversa com as amigas, essa é sempre uma receita de sucesso. Dessa vez o papo navegou entre a feira de Vigário Geral e suas ofertas imperdíveis de coisas para o nosso lar e bar (sim, gostamos de coisas para o bar de casa também - fetiche antes só dos meninos),  até as diversas provas de comidinhas de boteco, trocas de receitas e análises sobre os relacionamentos e suas similaridades com os sabores, aromas e características dos petiscos experimentados.

Depois das várias provas, durante as degustações e entre um bebericar e outro, nossos papos versaram sobre as características dos alimentos para nutrição do corpo e aquilo que alimenta (ou detona) a nossa alma,  ou seja,  o amor. Esse papo nunca pode faltar entre a mulherada. Somos ridículas  intratáveis quanto a esse quesito. 

Solteiras, casadas, recasadas,  recusadas,  separadas,  na coluna do meio ou mesmo carregando um "pau de correnteza" - ver: http://umavezerahistoriasdegente.blogspot.com.br/2013/12/pau-de-correnteza.html , sempre falamos "deles" ou para algumas, "delas",  mas sempre sobre o amor, seus sabores e dissabores. E falando de amor, acabamos nos debruçando sobre os nossos pares ou ensaiantes ao cargo ... 

Ô coisa difícil esse assunto de relacionamento! De aspirantes à santo aos filhos da puta assumidos, descobrimos que entre o bom e o ruim há muito mais variação do que podemos supor. Nada nem ninguém é uma coisa só,  uma única faceta previsível. E assim,  provamos muitos petiscos pela rua afora. Como sardinha e salmão no mesmo prato,  pelo mesmo preço,  como comida a quilo, somos pluralidades na mesma alma, todos nós:  nós, nossos "nós " e eles (ou elas).

A gente estica a prosa e quando percebemos, a prova era de um prato do "Desafio Doritos",  servido como uma "guacamole" da cozinha mexicana, só que ao invés do abacate, jiló como ingrediente substituto, para ser degustado junto com o Doritos. Mesmo disfarçado nos diversos temperos, o jiló estava lá amargando a boca da gente... Depois teve um croquete de jiló com rabada, que apesar da rabada super gostosa e apimentada, não negava ao fundo o gosto do jiló. O filho da mãe estava lá, amargo em algum momento. Moral da história é  que foi impossível não analisarmos a situação do ponto de vista dos relacionamentos. É aquele negócio,  o cara te conheceu traindo a namorada e você fica sabendo dessa graça depois, como confiar no sujeito que traiu a outra? Ele é muito bacana, muitas afinidades, a gente se encaixa, combina mas a porra do fantasma está lá. É difícil acreditar que o sacana se apaixonou perdidamente pelos seus encantos e não vai repetir a dose com você! Isso não é ruim? Mas ele é bom... E aí?

Outra crença que temos é de acreditarmos que vamos converter as opiniões políticas do par ou até mesmo fazê-lo levar uma "vida moderninha e deixar sua menininha sair sozinha" com as amigas para circuitar pelos bares, sem demonstrar uma dose de insatisfação. Será?

Jiló será sempre jiló,  quando não amarga de primeira, no fim você sente amargar, porque esse é o jiló, mesmo que você enfeite, tempere, misture, cubra, frite, asse, esquente, esfrie ou o apresente em diferentes nuances,  formas e acompanhamentos, o amargor estará lá e você o sentirá mais cedo ou mais tarde.

O "x" da questão é que não existe o famoso "par perfeito" e nem o "bem" e o "mal" separadamente, no estilo: essa pessoa é bacana e essa outra não presta. Essa dicotomia não faz parte do ser humano, quiçá dos relacionamentos... O que precisamos sentir é  se "deu liga", como as diferenças se encaixam, se o lado amargo dele (e que todos temos) é negociável para você, se você não está esperando que o balconista da farmácia te venda uma peça de filé mignon suculenta... Na farmácia se vende remédio! E é no açougue que se compra carne e ponto. Trata-se de aprendermos mais sobre as nossas expectativas do que sobre o outro. Esperamos coisas que o outro não pode dar ou gostos que não tem o sabor desejado. Sabemos disso mas insistimos em enquadrar o outro nos nossos ideais. Colocamos um óculos cor de rosa para ver poesia onde não há ou amargamos a vida do outro (e a nossa) com as cobranças e gosto de fel,que está em nossa boca. O mergulho necessário é o do autoconhecimento para não transformar a nossa vida em uma autossabotagem sem fim. Aceite o jiló como ele é, ele não pode enganar o seu paladar. A gente é quem tenta fazer isso incansavelmente. Ele é o que é e é você quem espera algo que ele não pode ser.

Osho diz que a nossa felicidade está diretamente ligada às nossas expectativas, eu diria que há até um pouco de matemática nisso, embora não seja uma conta tão racional assim. Por exemplo, se você espera "0" e o placar termina com um "10" você fica super feliz. O troço superou as suas expectativas. O forte do meu par nunca foi o romantismo com flores e longas cartas de amor e não espero isso dele mas vez por outra ele faz,  aí sempre me surpreendo e ele leva nota máxima. E isso é maravilhoso para nós dois, que ficamos extasiados! Sem sombra de dúvida, ele sempre foi o meu melhor namorado. Agora, se você espera "10" e o camarada te deu somente "2", isto é, 20% do que você desejava, você fica hiper frustrada e com raiva de receber essa miserinha. Portanto, espere coisas reais de pessoas reais!  O outro não é perfeito, nem você é a obra prima infalível, irretocável e única deste universo.

Precisamos lidar com as imperfeições, diferenças e sabores do prato que escolhemos (e muitas vezes gostamos muito) ou então: "garçom me vê o cardápio aí, troca meu prato que eu não gostei desse, afinal jiló não dá pra mim." Mas para outras, é um bom acompanhamento para a cervejinha não ficar solitária. E também conheço gente que ama jiló de verdade. Eu prefiro a cerva sozinha do que comer jiló. Tem sabores para mim que são inegociáveis...

O meu par por exemplo,  tem uma pitada de conservadorismo, aliás ele carrega consigo alguns "ismos" irritantes (um certo machismo, gotas de moralismo, saudosismos que elevam questões da nossa geração como sendo a melhor época, com os melhores valores), que entram em rota de colisão com o meu lado progressista,  apesar da nossa safra pertencer a mesma geração. Vivemos a juventude nos deliciosos e famosos anos 80,  quando transgredir significava matar aula para ficar com o namorado ou aparecer em casa grávida em plena adolescência. Geração coca-cola total. Hoje a juventude vive o poliamor e ele não consegue aceitar isso. Ok ok, às vezes eu também não entendo muita coisa mas tento aprender os valores dessa geração. Apesar de ter feito loucuras na casa dos 20, hoje ele tem um lado retrô charmosérrimo passeando comigo devagarzinho em sua Harley Davidson estradeira que tanto curto, seu capacete old school personalizado com óculos (tipo aviação) e um certo jeitinho tímido e careta que eu tanto amo. Ele é  plural e o conjunto da obra muito me agrada. Por vezes ele é intransigente com as suas convicções mas também ele é aquele que está junto "pro que der e vier", igualzinho a música do Geraldinho Azevedo. Apesar de não ser muito romântico, é extremamente carinhoso e gentil e, vez por outra me faz algumas surpresas. Mesmo quando estou com os cabelos desgrenhados e toda desarrumada, ele arruma um jeito de dizer que estou linda e de reafirmar todos os dias, de tantas formas, o quanto me ama. Isso tem preço? Não tem, é impagável. Cuida de mim e dos nossos filhotes lindamente mas é um bagunceiro de primeira. Não cozinha mas é o melhor ajudante de cozinha que já conheci.  Ele gosta que eu seja a chef e elogia todos os meus pratos, por pior que sejam rsrs. Gosta mais do dia como eu mas quase sempre bagunça minhas noites de sono (e eu adoro). Apesar de não ser vaidoso, é um gato ao natural. Enfim,  ele é lindo como é e o meu número. E eu o amo tanto!!! Com tudo isso, seus defeitos tornam-se quase insignificantes para mim. Mas de vez em quando marco meus territórios impenetráveis e inegociáveis!

Eu curto cerveja e vinho. Ele só toma vinho. Tomo a cerveja com as amigas e bebo o vinho com ele. Compartilhamos bons jantares feitos por nós, altos papos e muitas risadas, porém nunca bebemos na mesma taça e isso é bom, acho. Gosto do nosso encaixe sem sobreposição. Às vezes meu príncipe vira um chato mas do que posso reclamar?  A bela aqui, vira uma fera de vez em quando. Um monstro mora em mim e às vezes acorda. E ele, quando não o beijo docemente, adormece e se transforma em sapo. Então, nessas horas, ele acaricia a fera e eu beijo o sapo. Temos o nosso lado "feio" e estamos sempre aprendendo a conviver com essas versões de nós mesmos.

Pois é, já a minha mãe não deu essa sorte, meu pai era um galinha clássico, aqueles de carteirinha que tem escrito na testa: pego geral. Arf! Odeio isso, não consigo confiar em homens que olham para todos os rastros de saia que passam a sua frente. Meu pai beijava poste que tivesse cabelo comprido. Ô coisa patética, ele não podia ver mulher. Em contrapartida tinha um bom humor contagiante, um sorriso fácil (que herdei dele) e um jeito bom vivant de levar a vida. Porém, há mulheres que toleram a traição e a naturalizam do mesmo modo que eu rio e brinco com o meu marido quando ele reclama do meu vestido supostamente transparente, troco a calcinha por outra de tom mais escuro e saio bela e faceira com o mesmo vestido. Simples assim! 

E homens (ou mulheres) que são alérgicos a trabalho? Ai. Meu. Deus. Desses eu saio correndo. Não importa quanto ele ganhe, importa é que não seja um encostado ou filhinho da mamãe. Porque não está fácil pra ninguém e é bom que cada um corra atrás do pão de cada dia. Minha mãe também deu azar nisso, meu pai era desses que detestava trabalhar, era sempre chamado de "garoto grande", estilão Peter Pan,  daqueles que nunca crescem. E apesar de não corresponder as minhas necessidades e expectativas de filha, enquanto ele viveu recebi pelo entregador de flores todo dia 30 de novembro de cada ano, um estonteante buquê de rosas, acompanhado de um cartão com belas palavras e finalizado com um "eu te amo". Adorava isso! Ele era assim... Ele mesmo! Ele já se foi mas essas flores ficarão em minha memória para sempre.

Já a minha mãe,  apesar de jamais ter ouvido dela um "eu te amo",  cuidava da nossa saúde, estudos e toda a logística que envolve os cuidados e a proteção dos filhos. Gratidão total apesar de todas as nossas diferenças.

Bem, pra quem gosta de cinema  como eu, vale assistir "Relatos selvagens", filme argentino e espanhol, de 2014, e "Crash" (No limite ou colisão), filme estadunidense e alemão, de 2004. Ambos os filmes mostram as nuances de gente de verdade, que assim como nós, não separam em suas histórias o bem do mal, mas são facetas de uma mesma pessoa. Somos capazes de muito mais (ou muito menos) dependendo das circunstâncias, contextos e momentos de nossas vidas. Porque vida e morte moram na mesma alma, assim como bem e mal não são forças opostas mas habitam o mesmo lar, pertencem a uma única vida. Os encontros com outras vidas é que revelam muito de nós mesmos.

Eu começo as minhas histórias sempre com cartão verde.  Minha mãe sempre disse que isso era errado,  que não se deve abrir a guarda no início. Mas eu sou assim e gosto de confiar e acreditar que o mundo é bom, mesmo na minha versão 4.1. tenho um lado Polyanna que gosto de preservar. Para quem não conhece, Polyanna é um clássico da literatura infantojuvenil que conta a história de uma menina de 11 anos, que após perder o pai, foi adotada. Em seu novo lar, passa a ensinar as pessoas o "jogo do contente", aprendido com o pai. A brincadeira consiste em extrair o melhor e o lado positivo de todas as situações, mesmo nas piores experiências.

Lógico que se ficar difícil e houver falta, eu puxo o cartão amarelo! Mas, às vezes mostrar o cartão vermelho é necessário nos relacionamentos amorosos. Expulsão também pode fazer parte do jogo. Porque tem coisas, como diz uma amiga amada, que eu "NÃO SOU OBRIGADA! ". Ela tem razão e deveria patentear isso. Adooooro!

Cada um sabe o seu paladar, conhece os seus limites, isso é bom, não é?

Nesse circuito de boteco em boteco, a moela e a inovação do cachorro quente de língua não deu pra encarar não. Nem me atrevi, a essa altura da minha vida,  já sei o que não suporto.

E enquanto a conta não vem, a saideira, garçom! Porque jiló vai ser sempre jiló, moela vai ser sempre nojento (pra mim) e língua eu não como de jeito nenhum,apesar do conjunto da obra do prato. Assim, cabe-nos saber o que gostamos, aceitamos, negociamos e rejeitamos. Quando não desce, não dá pra forçar a barra. Tem coisas que nosso estômago não aguenta, dá um revés, vomitar é quase uma regra ou você pode ter uma grande indigestão!

Ah sim, no dia seguinte a esse circuito, fiquei enjoada com a farra de gordureba e jiló. Ainda sinto o gosto amargo em minha boca... Precisa ser assim? Porque "não importa o tamanho do boteco mas o sucesso da receita". E a receita (de tudo), sempre será uma mistureba de ingredientes, igual a gente, que é gente de verdade!

sábado, 21 de fevereiro de 2015

Bem sim, bem louca...


Era um dia como outro qualquer e biriblim, entra uma mensagem pelo whatsapp. Era de uma amiga: “E aí, você tá bem?”. Respondo sem pensar: “Tô bem sim, bem louca!”. Quase não me dei conta do excesso de sinceridade que me acometeu.

Em tempos de análise, crise por falta d´água, colapso político, perdas econômicas, amadurecimento pós 40 e mais uma lista infindável de trágicos acontecimentos (aumentados da minha parte dramática é claro), eu deveria encontrar o meu eixo, ou melhor, eu deveria ter um eixo, só que não. Ando cada vez mais pirada, louca e desequilibrada. Envelhecer, viver a vida acontecer  virou sinônimo de enlouquecimento.

Cansada da existência, levanto e caio, levanto e caio, levanto e tropeço, claudicante sigo, consigo, às vezes não. Há, por vezes, vontade de desistir, mas continuo. Não é bom?

Hoje em dia parece que anunciar nas redes sociais  que se está vivendo e fazendo coisas vale mais do que o que se vive. Como se satisfaz com a vida virtual? Como tanta gente faz, em tempos onde posar para postar é o que realmente importa. Babaquice pura?! Vaidade?! Competitividade?! Exibicionismo que se complementa pelo voyeurismo?! Que fenômeno absurdo seria esse?

Clarice Lispector escreveu certa vez que “uma pessoa podia gastar-se sendo apenas”. Pronto, me sinto gasta, queria ter escrito essa frase, seria facilmente de minha autoria mas não foi. Me contento em reproduzi-la. Amo Clarice, ela sempre traduz a minha alma.

Esgota sentir, ser, cara na vida, vida na cara, deve ser por isso que as pessoas desenvolvem uma segunda vida nas redes sociais. Hoje tenho preguiça de existir e tenho também preguiça das pessoas, tô gasta. Ao contrário da maioria, não tenho saco para as redes sociais embora a utilize esporadicamente. Vai entender?! Há medo mas também esperança. Reclamo com a vida da vida. Ainda a desejo apesar dos pesares.

O problema também é que faço muita besteira, sou literalmente uma “merdeira”, tenho uma existência tão errada que até as besteiras me acham besta. Isso me gasta ainda mais, pois vivo me desculpando, me reparando, me consertando com a vida. Não é chato isso?

Já tive sorriso mais fácil e vívido, agora ele me vem mais difícil e até opaco, deve ser a idade. Poucos velhos tem um sorriso límpido e aberto. Nesse ponto tenho vontade de ser como era antes. Tenho a impressão corriqueira de que não falo coisa com coisa. Falo coisa com gente, vejo gente com coisa. Escrevo sem pensar. Se pensar muito, apago tudo.

Ter um filho é viver vigilante e sobressaltada. A gente fica magra e nervosa ou então gorda e nervosa, mas sempre nervosa. É a natureza das mães, acho. A gente sempre tem medo que aconteça o pior. Leva o casaquinho, se comporta, presta atenção, juízo, não mexe em nada, não mergulha no fundo, escova os dentes, coloca o chinelo e etc e tal. Deve ser o medo das mães que protege os filhos. Não conheci até hoje nenhuma mãe que não tivesse medo. Todas são apavoradas.

Estou inquieta, indecifrável. Sempre quis um homem que me entendesse e que me explicasse. Por vezes não gosto da explicação agora que o tenho. Ele me acha louca, penso. Mas creio que deva me amar assim mesmo. Isso também é bom, não é? Devo ser complexa e complicada demais. Nem eu me aturo. Há desconforto em viver, sinto esse desconforto como se procurasse uma posição que me trouxesse apenas: paz. Sempre fui assim, sem paciência, sem paz interior. E isso é uma merda! Às vezes tenho vontade de meditar, mas não sei como se faz.

Morte e renascimento fazem parte de mim mas tem horas que só a redenção ao silêncio me conforta. Então calo-me, escuto-me. Adianta porra nenhuma para conquistar a paz interior. Continuo embaralhada e embarulhada por dentro.

Desde sempre fluo instável, coisa ruim de se admitir! Quase sempre penso na morte e por vezes (muitas) desejo encontrá-la e é  aí que começo novamente a travar uma luta contra ela. No ímpeto de viver, como de costume, claudicante vou seguindo. Vida, morte, vida, morte...

Sobrecarregada de mim mesma penso: passa rápido tempo! E coloca as coisas no lugar. Que lugar?Aproveita e leva contigo essa sensação de sufocamento. E, quando estiver tudo bem, tempo, que você passe bem devagar.

E assim sigo bem, bem louca!